Como falar com um adolescente que não quer falar?
Recebo pais consternados com o mutismo de seus filhos adolescentes. Monossilábicos, respondem sim ou não, tudo normal —deixando sem resposta questões simples como: como foi seu dia, como está indo na escola, quer alguma coisa???
Uma mãe que eu atendi chorava de tristeza, enquanto o pai, com raiva, dizia deixa para lá, não precisamos nos importar com ela.
Como se importar sim, mas sem desesperar ou retaliar? Continuar buscando a comunicação apesar do nosso ego estar massacrado pela rejeição do filho (a)?
Muitos são os motivos desta conduta indiferente e, provavelmente, nenhum deles envolve falta ou perda do amor por você. É comum os “jovens adultos” não saberem como comunicar o que estão sentindo, terem vergonha de mostrar seu lado mais independente, ficarem inseguros com medo de serem rejeitados ou causarem decepção aos pais. Ficar quieto e indiferente pode ser uma conduta cautelosa.
A decepção, frequentemente, pode ser de si mesmo, que é o mais baixinho da turma, que não tem seios ainda, ou que está gordinho e não se destaca corporalmente.
A adolescência é tipo uma grande obra em construção no corpo e na cabeça. De repente seu filho começa a crescer muito rápido (estirão de crescimento), o corpo muda de forma (nas meninas, seios e quadris se desenvolvem; nos meninos, a voz engrossa e aparece barba). Enquanto isso, o cérebro deles, especialmente a parte que planeja a tomada de decisões (o córtex pré-frontal), ainda está se arrumando, fazendo com que sejam mais impulsivos e queiram experimentar coisas novas.
E tudo isso acontece por causa de uma bagunça de hormônios que são liberados no corpo (ativação do eixo hipotálamo-hipófise-gonadal (HHG).). Hormônios são “chefões” que mandam construir e modificar tudo, fazendo surgir, aos poucos, um corpo de um adulto. É uma fase de muitas descobertas e adaptações, tanto por fora quanto por dentro!
Tomar consciência e identificar por que seu filho adolescente não quer falar com você pode ajudar você a descobrir como prosseguir e fazer os ajustes necessários.
Aqui estão algumas razões pelas quais seu filho adolescente não quer conversar:
- Dificuldade em expressar sentimentos e emoções em palavras: Essa é uma tarefa difícil até mesmo para adultos.
- Sentir-se ansioso e estressado: Demandas acadêmicas, rompimentos, conflitos nos relacionamentos, mal-entendidos entre amigos… Em meio a tudo isso, o silêncio pode parecer um alívio para o estresse e a ansiedade. Falar pode trazer de volta sentimentos dolorosos que a pessoa está tentando evitar.
- Vergonha de discutir seus desafios ou dificuldades: Pedir conselhos pode parecer um sinal de fraqueza. Lutar sozinho pode ser interpretado como força. Muitos adolescentes relutam em conversar com os pais porque acreditam que “deveriam ser capazes” de lidar com tudo sozinhos.
- Medo de decepcionar os pais ou receber uma resposta negativa ou punitiva: O maior medo do seu filho adolescente pode ser justamente decepcioná-lo ao mostrar seus erros e fragilidades. Ele já prevê como vocês costumam reagir — com críticas, julgamentos ou punições. Permanecer em silêncio parece mais seguro.
- Muitas perguntas: Alguns pais interrogam demais, fazendo perguntas detalhadas e sucessivas, como se o filho estivesse diante de um júri implacável. Isso pode gerar bloqueio em vez de abertura.
- Eles sentem que você não confia neles: Como se abrir e contar algo difícil se já se espera ser julgado ou culpabilizado? A falta de confiança percebida bloqueia a vulnerabilidade.
- Você transforma a conversa em algo sobre você: A pessoa compartilha algo importante e, em vez de escutá-la plenamente, você traz sua própria experiência, tirando o foco dela. Lembre-se: esse é o momento do outro, não o seu.
Como fazer seu filho adolescente falar com você
Você não pode forçar seu filho adolescente a conversar, mas pode criar um ambiente seguro, acolhedor e positivo, onde ele se sinta à vontade para se abrir.O que ajuda a abrir o canal de comunicação:
- Esteja disponível
Mostre que tem tempo para ele, mesmo sem agenda formal. Deixe a porta do quarto aberta, evite estar sempre no celular e crie oportunidades espontâneas de conversa. - Mantenha uma presença calma e acolhedora
Evite transmitir estresse, raiva ou julgamento. Um ambiente emocionalmente seguro estimula a aproximação. - Valorize e elogie genuinamente
Reconheça os esforços do seu filho, mesmo em pequenas ações. Elogiar o que ele valoriza fortalece a autoestima e a conexão. - Comunique-se da forma que ele prefere
Use o canal de comunicação com o qual ele se sente mais confortável: mensagens, bilhetes, emojis ou conversas informais. Observe como ele se comunica com os amigos. - Repare a relação
Se houve afastamento, reconheça sua parte e demonstre desejo sincero de melhorar a relação. Peça feedback: “Como posso fazer com que você se sinta mais à vontade para conversar comigo?” - Valide os sentimentos dele
Se ele se abrir, escute com calma, sem interromper ou julgar. Reflita sobre o que ele diz, valide sua dor e, se necessário, peça desculpas. - Tenha empatia
Lembre-se de como era ser adolescente. O que você sentia? O que precisava dos seus pais? Essa reflexão pode ajudar a entender melhor seu filho hoje.
Importante lembrar:
- Seu filho não está contra você — ele está lidando com mudanças intensas (físicas, emocionais e sociais).
- A adolescência pode ser confusa e solitária. Sua presença estável é mais valiosa do que conselhos prontos.
- A única coisa que você pode controlar é a sua resposta.
- Não desista. Mesmo que ele esteja fechado agora, isso pode mudar.